RETORNO AO CAIS DA BEM-AVENTURANÇA
O caminho sombrio que a humanidade
Na trilha do caos percorre,
Originária da escolha
Que nos fez seres decadentes
(Porquanto fomos tomados
Pela consciência doentia de nossa decrepitude),
É cheio de imprevistos, de ciladas e de lamentações...
E repleto de tantos tantos escolhos inesperados...
Sentimos que vem ao nosso encontro
Um vento gélido sussurrando incessantemente
Enquanto desfrutamos
Da morte com sua fisionomia
Esquálida e fria.
Uma fisionomia que nos faz lembrar
Que na frente do espelho
O nada é a nossa imagem e semelhança
A refletir um olhar lacrimal cheio de incertezas.
Desde que nascemos
Trazemos o germe da morte
Impregnada em nosso ser.
Desde que nascemos
Desfrutamos da ciência
Do bem e do mal.
Desde que nascemos
Aprendemos a sorrir e a chorar,
A bem-dizer e a maldizer,
A amar e a odiar,
Vivendo sob um conflito lacerante.
Nesse jogo incessante
De opostos irreconciliáveis,
O que esperar do homem
Senão miséria, corrupção e iniquidade
De sua própria natureza transviada?
Pois a vida, tão consumida
Pela inexorabilidade do tempo,
Vem a ser um carnaval
De ilusões e de descobertas,
E também de surpresas e de vicissitudes.
Tudo o que nasceu
Sentiu a angústia das perdas inesperadas,
Bem como as renovações profundas.
Mas todos os que morreram, certamente
Aguardarão sinais e respostas misteriosas
Que um dia lhes serão reveladas!
Mas até quando contemplar
A morte na sua terrível frieza:
Consequência direta
De nossas depravações
E de nossas pecaminosas seduções?
As trevas tomaram conta do mundo
E o abismo é criado a passos largos
Pela inteligência humana
Que tudo pretende
Presunçosa e de forma soberba invadir.
A ausência de calor
Fez brotar o frio que acumula na alma;
E a ausência de amor
Fez penetrar a morte sobre nossas vidas.
A ausência de virtude e de benevolência
Produziu o ocaso da maldade;
E a ausência de uma fé abrasante,
Criou a dúvida que nada constrói e edifica.
A luz é quem dá orientação e direção
Para todo aquele que vive a esmo;
Assim como o amor é quem cria sentido,
Como também dá vida e vigor
Para a alma que jaz moribunda
Diante de tantos rancores e ressentimentos.
Mas é no cais da bem-aventurança que estará
Todo aquele que busca sair desse conformismo;
É no cais da bem-aventurança
Que estará aquele que preferiu
Tão somente se munir da luz da graça.
Ao invés do ódio e do rancor,
Preferiu antes irradiar a luz do amor,
Vivendo independente dos espectros
De tão agudos espinhos
Capazes de macular as almas
De quem se alimentou de muitas abominações
Com aspecto de bons frutos.
É o destino das almas
Enriquecidas de sinceridade e fervor,
Viver tão somente da poesia inspirada
Pelos clamores dos grandes homens de Deus.
No lirismo de suas preces,
Há uma ânsia que um dia irá cessar,
Uma ânsia de voltar integralmente
Aos braços do fiel cordeiro
Que prevalece até o fim dos séculos...
No clamor de uma alma contrita
Saem palavras cujo intento é triunfar
Sobre o que perece e o que não prevalece...
E, em contrapartida, se alimentar
Somente do que edifica o ser...
E somente do que é perene e imutável.
Pois as trevas não prevalecerão sobre a luz,
Tampouco a morte reinará sobre a vida
Dos que amam sinceramente a Cristo!
Como a morte não equivale a vida,
Não tem força alguma diante da eternidade,
Assim também o mal não tem
A mesma equivalência do bem,
Porquanto não participa
Do reino da luz e de suas miríades de justos!
A força do bem há de prevalecer...
E a riqueza do amor certamente
Há de edificar eternamente
A vida dos cansados e oprimidos.
A vida serenamente irá governar
(Vencendo então todo o jugo da morte!),
Enquanto a graça há de triunfar
No coração aflito
De todos os justos que nunca se venderam
Em troca de tudo o que está fadado a se esvair.
O que está, infelizmente, distante de toda
Essa perfeição de Deus
(O único a nos dar hospitalidade eternal)
Fica desprovido
De uma razão de ser,
De um sentido último
Que nos motive a viver
Nos mais altos cumes da liberdade.
Mas todo aquele que retornou
Ao cais da bem-aventurança
E se ornamentou
De novíssimas e puras vestes
Presenteadas pelo Rei da eternidade,
Viverá guarnecido de uma fortaleza
E de uma riqueza que não se compra
Em nenhum lugar desse mundo.
Somente uma riqueza dessa magnitude,
Uma riqueza composta por cordas
De um amor excelso e libertador,
É que pode ataviar
De encantos todos o que são
Capazes de reconhecer o justo caminho
Aberto pela luz de seu único e fiel redentor.
Alessandro Nogueira
Enviado por Alessandro Nogueira em 11/12/2016
Alterado em 24/12/2020