O DESPERTAR SUPREMO DO SER

     O nosso maior despertar religioso, cujo impacto é o de efetivamente nos religar; ou se se preferir, o nosso maior lampejo de humanidade (no melhor sentido da palavra) que nos aproxima do ser do outro e da vizinhança do amor divino, não está em seguir preceitos impenetráveis e vazios e, menos ainda, em se apoderar de um credo religioso que impõe normas de conduta de forma cega e irrefletida, de forma dogmática e coercitiva. Na verdade, reside em nossa profunda compaixão, em nosso amor mais elevado que nos arranca da banalidade da vida para nos lançar de encontro com a alma de nossos semelhantes e dos seres vivos que nos rodeia. Por isso, como bem diz Schopenhauer, os preceitos éticos e morais se tornam opacos e inócuos quando são impostos para alguém que não faz questão dessa humanidade. No entanto, se tornam plenamente significativos quando existe aquela abertura de um ser com e para o outro esvaziado de sua pretensão de superioridade; quando, portanto, o ser humano transcende a sua condição egóica e limitada pela autopreservação a qualquer custo para se aproximar de quem não podemos facilmente compreender, ou seja, de quem nos afeta com sua presença ao nos chamar e conclamar para a escuta e o cuidado. É uma liberdade que faz com que o ente humano, ao desvelar a verdade do seu ser, deixa de viver como boa parcela de indivíduos vivem, ou seja, no seu egoísmo insano, para adentrar nos mistérios do face a face que norteia o dialogo, a amizade, a solidariedade: virtudes desprovidas de qualquer garantia de ganho ou reconhecimento; mas, como compensação, providas pela arte de ser em face dos demais na sua infinitude de incógnitas.